A Curitiba de Vladimir Kozák

"A cidade dos estrangeiros"

Por Fernanda Maranhão

Vladimir Kozák chegou a Curitiba, capital do Paraná, em abril de 1938. Logo nos primeiros dias, caminhando pelas ruas da cidade nas manhãs frias do outono, Kozák sentiu uma estranha sensação de familiaridade. Pela primeira vez após 14 anos vivendo no Brasil, sentia que poderia finalmente criar raízes em uma cidade brasileira. As estações bem definidas e o clima ameno de Curitiba (PR), lembrava a sua Morávia, região da Tchecoslováquia onde nascera.

 

Na década de 1940 o município de Curitiba (PR) possuía uma população de aproximadamente 120.000 habitantes, marcada por uma grande diversidade cultural. Muitos imigrantes europeus alemães, italianos e eslavos haviam se estabelecido na capital do Paraná e arredores desde o final do século XIX.

 

Clubes, associações e escolas foram fundados principalmente por alemães e italianos. Estes imigrantes também eram proprietários de diversos estabelecimentos comerciais como padarias, cervejarias e hotéis. Nas ruas era comum ouvir as melodias dos diferentes idiomas europeus.

Foto 1 - Hotel Johnscher em Curitiba/PR. Atualmente o hotel pertence a cadeia San Juan Hoteis.

Foto 2 - Vladimir Kozák no Hotel  Johnscher.

Foto 3 - Karla Kozáková ao lado de seu irmão em uma de suas residências na cidade de Curitiba.

Foto 4 -  Bebedouro no Largo da Ordem em Curitiba, década de 40, quando os colonos da zona rural vinham com suas  carroças para vender a produção de hortaliças, leite e ovos no centro de Curitiba.

Nos arredores da cidade havia núcleos de imigrantes camponeses, a maioria italianos, poloneses e ucranianos, que abasteciam Curitiba (PR), trazendo em suas carroças, broas de centeio, leite, queijos, embutidos, vinhos, legumes e verduras.

 

Kozák fora transferido pela empresa norte americana Eletric Bond and Share Company (EBASA), onde trabalhava desde 1930. Como engenheiro atuou nas filiais da empresa em Belo Horizonte (MG) e Salvador (BA), coordenando os serviços de iluminação e transporte público. Na Companhia Força e Luz do Paraná, filial da empresa em Curitiba (PR), assumiu o cargo de superintendente geral.

 

O escritório da companhia ficava em um imponente casarão que existe até os dias de hoje na Praça Eufrásio Correia, em frente ao Shopping Estação. Nas proximidades, junto a subestação do Capanema, a empresa cedeu para o novo gerente, uma bela casa onde Kozák morou com sua irmã Karla por mais de dez anos.

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Fotos: Usina de Chaminé em São José dos Pinhais (PR) - Fotos tiradas por Vladimir kozák na década de 40. Imagens pertencentes ao acervo do Museu Paranaense / SEEC - Governo do Estado do Paraná

No Paraná, Kozák tinha como missão garantir o abastecimento de energia da capital, gerenciando os serviços de iluminação pública e transporte coletivo, na época feito por bondes elétricos. Diversas vezes ao mês, deslocava-se até a Serra do Mar para vistoriar a Usina Hidrelétrica Chaminé, instalada no rio São João, município de São José dos Pinhais (PR). A energia hidrelétrica produzida na usina era transportada até a subestação do Capanema em Curitiba (PR), através de linhas de transmissão. Cabia a Kozák fazer a manutenção destas linhas e fiscalizar a distribuição da energia elétrica nas ruas e residências.

 

Além do trabalho, ele tinha muitos outros interesses que compartilhava com um pequeno e fiel círculo de amizades, formado em sua maioria por estrangeiros.  O montanhismo e as expedições ao ar livre, as artes plásticas, a botânica e em especial a fotografia e o cinema eram as atividades prediletas de Kozák em seu tempo livre.

 

A Serra do Mar era o local favorito para fazer caminhadas e expedições. Frequentemente, aos domingos, organizava saídas para o Pico Marumbi. Seus companheiros de escalada eram o inglês Mr. Norman Rowe, o medalhista argentino José Peón e a amiga canadense Marjory Baillon. A atividade começava cedo com um café da manhã as 6 horas no hotel Johnscher, situado na Rua Barão do Rio Branco próximo à estação do trem, também na Praça Eufrásio Correia.

 

Em seguida, o grupo pegava o trem Curitiba-Paranaguá na antiga estação, onde hoje está localizado o shopping Estação. Todos desciam na estação Marumbi e a partir daí faziam uma longa caminhada até o pico do Marumbi.

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Foto: Quadro pintado por Vladimir Kozák retratando a Serra do Mar no Paraná. 

Imagem pertencentes ao acervo do Museu Paranaense / SEEC - Governo do Estado do Paraná

As imagens da serra do mar registradas por Kozák em fotografias e filmes eram por ele utilizadas na criação de pinturas e desenhos. Kozák pintou com maestria a estação e o Pico Marumbi, as cachoeiras, as bromélias e orquídeas e os engenhos de cana-de-açúcar da região.

 

Frequentador das raras exposições de arte que ocorriam na cidade, Kozák conhecia alguns dos artistas locais mais importantes. Seu nome consta no livro de presença da exposição realizada no edifício Garcez em 1941, em homenagem póstuma ao artista norueguês naturalizado brasileiro Alfredo Andersen.

 

Entre os amigos artistas mais próximos estão o polonês Czeslaw Lewandowski, pintor da paisagem paranaense, o brasileiro Arthur Nísio que estudou pintura animalista na Alemanha, a retratista americana Gene Woiski e o medalhista argentino José Peon. Com eles trocava idéias, experiências, conhecimentos técnicos e obras de arte.

 

Vladimir Kozák trabalhou na Companhia Força e Luz do Paraná (atual COPEL) até 1954, quando passou a exercer integralmente a atividade de documentarista no Museu Paranaense e na Universidade Federal do Paraná. Nestas instituições, passou a registrar em fotografia e filmes os povos indígenas e a cultura popular brasileira. Nesse período passou a morar em um chalé no estilo eslavo, que mandara construir no bairro Uberaba. No andar de cima do sobrado mantinha seu ateliê de pintura e um espaço especial para a revelação de suas fotografias e montagem dos filmes que produziu. Atualmente o sobrado sedia a Casa de Leitura Vladimir Kozák, administrada pela Fundação Cultural de Curitiba.